sábado, 2 de fevereiro de 2013

                          DESABAFO DO ORÁCULO DO PÃO DE 01 A 03 DE FEVEREIRO DE 2013 



“SIM À SOLIDARIEDADE, 
SIM À AÇÃO, 
NÃO À EXPLORAÇÃO!!!”       
     
Recebi ontem uma Edição Especial de uma revista semanal e, em seguida, telefonei para meu pai perguntando se ele não gostaria de ler o exemplar – afinal ele é uma pessoa que gosta de estar bem informado, analisar diferentes pontos de vista e tem uma visão crítica sobre o que ocorre ao redor. Ele é um homem de poucas palavras; e é preciso “cutucar” para saber o que pensa. 
Qual não foi minha surpresa ao ouvir: “Não aguento mais escutar sobre Santa Maria. Quando vão parar de explorar essa tragédia?”.
Parei para pensar, afinal não era a opinião de alguém que fosse insensível à dor do outro, muito pelo contrário, e deparei-me com o tênue limite entre sensibilizar e conscientizar a população e explorar de modo perverso uma tragédia, desrespeitar os envolvidos. Por que publicar uma edição especial com fatos que já foram amplamente divulgados sob a pecha de fatos inéditos?
Em resumo, nesse caso específico chegou-se à conclusão de que a negligência da prefeitura, dos donos da casa, da banda que se apresentou...levou a uma catástrofe. E o que cabe aos veículos de comunicação e a nós fazer a partir de então?
Há duas opções: usar o terrível evento como aprendizagem para evitar outros semelhantes ou usá-lo para atrair a audiência de alguns que se alimentam da morbidez dizendo “Graças a ‘Deus’ não foi comigo”. (Coitado de Deus, o que Ele tem a ver com isso?)

Será que a mídia está preocupada com a dor que a excessiva divulgação do fato está causando aos diretamente afetados pelo incêndio da Boate Kiss? Caso seu filho estivesse entre as vítimas, como se sentiria se ao ligar a televisão, o rádio, conectar-se à Internet sempre visse em destaque o horror de Santa Maria? Isso o ajudaria a seguir adiante?

A imagem de uma mulher, viúva há dois anos, que perdeu seus dois filhos no incêndio, consolando em vez de ser consolada, chamou-me a atenção; em especial após vê-la ser abraçada por uma conhecida, dar as costas à câmera e partir chorando.

Meu desabafo não é uma execração à imprensa, muito pelo contrário. Admiro os meios de comunicação e seu compromisso em alertar a sociedade sobre os mandos e desmandos, mas é importante estabelecer limites entre o que é publicado para conscientizar e informar a população e aquilo que só serve para gerar comoção desmesurada e sensacionalismo. 

O caso “Nardoni” causou grande comoção nacional. A atenção foi tamanha que só faltou ser divulgado o que o pai e a madrasta de Isabela tomavam no café da manhã, e algum especialista em nutrição dar sua opinião sobre como os hábitos alimentares do casal influíram no crime.

Alguém acompanhou o caso Suzane Richthofen, acusada e presa por ter planejado a morte dos próprios pais com o auxílio do então namorado Daniel Cravinhos e do irmão deste,  Christian Cravinhos, e sabe se seu pedido de progressão de pena para regime semiaberto foi aceito ou negado?

O que sucedeu a Guilherme Pádua e sua esposa Paula Nogueira Tomaz após terem brutalmente assassinado Daniela Perez com 18 punhaladas? Pelo que sei ambos estão em liberdade.

Lembra-se do maníaco do parque que violentou e executou inúmeras garotas cujo desejo era se tornarem modelo? Onde está ele? Qual foi sua pena? Você se recorda?

Infelizmente, a memória de muitos, em virtude das exigências do dia a dia é curta, assim como a minha, e o desenlace de tais ocorrências, de modo geral, só continuam a ser acompanhados por profissionais comprometidos com o estudo comportamento humano.

Ressinto-me ao perceber que a mídia não reserva o mesmo espaço a histórias de superação como a do atleta paraolímpico Oscar Pistorius, de 24 anos, que disputou os 400m no Mundial de Daeguque em 2012 com atletas olímpicos.

Infelizmente, tenho a impressão de que hoje brincamos de amarelinha, dirigindo nossa atenção de uma catástrofe a outra, agradecendo por não termos sido, dessa vez,  atingidos.
Mas, como disse Shakespeare: “As histórias da humanidade são semelhantes” - grande parte delas tem como origem o descaso. Qual seria sua reação ao saber que talvez você, ou os que lhe são próximos, fosse o próximo alvo?


A charge de Cavalcante pode parecer mórbida, mas representa a triste e pura realidade.

Com indignação,
Cláudia Coelho


PS: Caso queira ouvir uma abordagem mais ampla e positiva sobre as implicações e reações à tragédia de Santa Maria, acesse a entrevista realizada com a Monja Coen e o professor da FMUSP e psiquiatra Mário Rodrigues Lousã que foi ao ar no programa “Caminhos Alternativos” da rádio CBN em 02 de fevereiro de 2013:


http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=jgEcld01zPI




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